Do mau ao Ben: a primeira semana de Simmons nos Nets

por out 29, 2022

Depois de um hiato de mais de um ano (foi em junho de 2021, quando isto aconteceu), Ben Simmons está de volta aos courts da NBA. Com Kevin Durant e Kyrie Irving também disponíveis, o início da época trouxe finalmente o primeiro vislumbre da visão que os Brooklyn Nets tinham para a sua equipa desde a troca que enviou Harden para Philadelphia, trazendo de volta o base australiano.

Os primeiros retornos… não têm sido bons. E enquanto ‘KD’ e ‘Kai’ parecem estar na sua melhor forma, destruindo defesas (embora mais individualmente que em equipa) e acumulando linhas estatísticas impressionantes, Simmons aparenta ser uma sombra de si mesmo, com os defeitos que já lhe eram apontados ainda mais evidentes: falta de agressividade a atacar o cesto e passividade na hora de lançar. Em cinco jogos (e 155 minutos), acumula totais de apenas 28 pontos em 27 lançamentos e 10 lances livres tentados, contra 22 faltas e 14 perdas de bola. Acumula mínimos de carreira em praticamente todos os índices estatísticos, com máximos em faltas e em percentagem de possas de bola suas que terminam em perda da mesma. Neste último capítulo (TOV%), é mesmo o pior da NBA de entre os 59 jogadores com pelo menos 150 minutos acumulados este ano; é também o pior em TS% e o segundo pior em Offensive BPM (apenas à frente de Lu Dort).

Os Nets, entretanto, acumulam para já um registo de 1-4, com a pior defesa do campeonato, e antepenúltimos em NetRtg. Apesar do calendário difícil (derrotas contra Pelicans, Grizzlies, Bucks e Mavericks em OT), a equipa de Brooklyn parece navegar pelos jogos sem identidade ofensiva, vivendo da inspiração dos predestinados Durant e Irving. Do outro lado da bola, a sua defesa é aquela que permite a quinta melhor eficiência de lançamento aos adversários, e são apenas a 28.ª equipa que apanha maior proporção dos seus ressaltos defensivos, permitindo muitas segundas oportunidades aos seus oponentes.

É Ben Simmons o problema, ou parte dele? Vamos olhar para o filme, e tentar perceber.

No ataque

Steve Nash tem utilizado o seu base para trazer a bola para o meio-campo ofensivo, sendo que de seguida entrega a bola a Durant ou Irving, e passa a ocupar o dunker spot, por questões de espaçamento da equipa. É daqui que tem marcado a maioria dos seus pontos (tem apenas um lançamento em suspensão tentado em toda a temporada).

Também da zona do poste baixo, quando isolado, arrisca ocasionalmente movimento para dentro, com uma espécie de gancho de direita:

É um uso inteligente do jogador, que não representa qualquer ameaça ao nível do lançamento, e em zonas interiores pode fazer uso das suas boas mãos para receber passes e finalizar, ou encontrar companheiros a partir de posições interiores, tanto isolado no poste, como a partir do short roll, em bloqueio directo (algo que Steve Nash deverá incorporar bem mais no seu playbook).

Tudo isto funciona bem em teoria, mas Ben Simmons tem de confirmar que é de facto uma ameaça enquanto marcador de pontos, ou continuará a ser ignorado nessa vertente, limitando o resto do seu repertório ofensivo. No lance abaixo, e apesar de resultar em assistência, ficamos com a sensação de que Simmons continua fora dela, ao evitar o lançamento (é perfeitamente possível que esteja relacionado com não querer ir à linha de lance livre) em detrimento de uma solução menos óbvia. Ouçam Kyrie Irving:

Neste lance, Luka Doncic sai da sua frente, pouco interessado em contestar um jogador embalado para o cesto e em poder acumular uma falta. Ben Simmons, infelizmente, ainda tinha menos vontade de a sofrer:

Ele sabe que afundar é válido, certo?

A falta de confiança nestes lances é evidente, fazendo com que não só arrisque pouco no capítulo do lançamento como o faça completamente a medo, evitando contactos em gestos apressados e pouco ortodoxos. Onde Simmons terá de recuperar esses índices será em campo aberto, em situações transição e semi-transição, onde revelou ser um dos melhores jogadores da liga antes da sua prolongada paragem, e temos visto alguns exemplos:

Ainda assim, o jogador tem estado com bastantes falhas neste capítulo, com tomadas de decisão perfeitamente incompreensíveis para um jogador do seu nível:

No lance acima, Simmons tem uns bons 8 metros ainda à sua frente, e em vez de acelerar e colocar pressão na defesa (colapsando-a e dando o triplo a Joe Harris no canto), faz um passe pouco convicto para Day’Ron Sharpe (?), que nem sequer se encontrava numa posição especialmente privilegiada. E o que dizer disto?

Sim, juntar uma compilação de vídeos curtos num artigo pode ser injusto, porque podem não representar o global do que um jogador faz no seu todo – toda a gente pode fazer um destes passes durante o ano. Mas Simmons vai em três destes, e estamos apenas com cinco jogos.

Na defesa

É sabido que é na defesa que Ben Simmons é verdadeiramente transformador, tendo sido candidato a defensor do ano em 2020-21, consagrando-se como o melhor defensor de perímetro em toda a NBA. Os Nets, com a pior defesa do campeonato, precisam desse jogador o quanto antes, tanto para proteger as deficiências de Kyrie e dos restantes shooters, que na sua maioria deixam a desejar desse lado da bola. Temos visto bons sinais:

Aqui, contém o portador da bola saído do bloqueio directo enquanto controla a linha de passe para o seu homem. Quando Dinwiddie vira para o lado fraco e Watanabe é batido pelo seu homem, Simmons é rápido a ajudar e a fechar o meio, provocando o turnover. Para uma defesa que só terá sucesso se souber trocar com competência, estes tipos de ajudas serão fundamentais.

Aqui identifica o mismatch claro entre Doncic e Irving, não perdendo o esloveno de vista. Temporiza bem o ‘2×1’ e consegue o roubo de bola com a sua envergadura. Deixou Tim Hardaway Jr. sozinho, mas é um erro de Watanabe e do colega de equipa no lado fraco, que têm uma falha de comunicação e não saem ao armador dos Mavs.

Simplesmente não há muitos jogadores no planeta que façam Giannis Antetokounmpo pensar duas vezes antes de atacar o cesto, nesta situação. No jogo contra os Bucks, o australiano teve muito sucesso contra o grego durante a primeira parte, limitando-o a 9 pontos.

Mesmo em zonas interiores, que poderá ter de ocupar bastante este ano, Simmons pode ser útil com o seu poder de antecipação a lançamentos de big men com pouca destreza com a bola:

É definitivamente deste lado da bola que Ben Simmons recuperará os seus melhores índices anímicos e competitivos. Sem bola e holofotes a ocupar-lhe os pensamentos, permanece livre para ser um terror no ponto de ataque ou longe dele, e voltar a ser um dos melhores defensores que a NBA tem para oferecer. Até isso acontecer, nem tudo tem sido perfeito, com a evidente falta de condição física a deixá-lo mal mais do que uma vez, tomando decisões erradas:

Aqui, lê bem o slip de Brandon Clarke e fica com o shooter, mas está colado ainda demasiado longe do cesto, quando o lançamento já não representa um perigo. Ser batido por Desmond Bane numa corrida até ao cesto parece ser indicativo de que ainda recupera a melhor forma física. Novamente, desta vez com Jrue Holiday, a finalizar pela esquerda sem qualquer oposição:

Mais preocupante tem sido o número de faltas. Ben está a acumular 5.1 faltas por 36 minutos de jogo, e foi excluído em dois dos cinco jogos dos Nets, algo que simplesmente não pode acontecer. Tem seis (!) faltas ofensivas marcadas contra si, todas envolvendo bloqueios ilegais. Integrar Simmons no ataque vai envolver muitos bloqueios do australiano, quer longe da bola quando estiver no dunker spot, quer imediatamente após entregar a bola à mão no perímetro, e melhorar este princípio fundamental do jogo vai ser essencial.

Quanto às faltas defensivas, apenas quatro foram faltas de lançamento. Há técnicas e faltas longe da bola, e também alguns reach displicentes, como este:

Com 20 segundos no relógio e sem qualquer perigo do seu opositor subir para lançar, qual a vantagem de pressionar Valanciunas um passo atrás da linha de triplo, que nem sequer tinha interrompido o drible para apanhar a bola? E o que dizer desta falta, contra um dos melhores handlers da liga, em crunch time?

Concordo que a falta é assim meio forçada, mas o que esperava Simmons conseguir ali, para além de ser batido em velocidade, ou… cometer uma falta?

O que significa o actual Ben Simmons para os Nets?

O conjunto de Brooklyn tem problemas bastante reais extra-Simmons com que se preocupar, mas resolvê-los obriga sempre a integrar o australiano na solução, não há outra hipótese. Conseguirão coabitar o base com Nic Claxton, e sobreviver à falta de espaçamento que dois não-lançadores trazem ao jogo? Até agora não, mas prescindido de Claxton, e jogando com um frountcourt KD-Simmons, sacrificam ressalto, onde têm sido bastante maus nos últimos dois anos, e assim têm continuado. A solução pode passar por uma presença interior com capacidade de lançamento; em graus diferentes, Myles Turner, PJ Washington ou Mike Muscala podem ser ajudas vindas do mercado.

Os Nets deverão também pensar em jogar mais rápido com o canhoto em campo, maximizando as suas oportunidades em campo aberto (são apenas vigésimos em pace); algo que será mais fácil de conseguir se conseguirem deixar de ser a pior defesa do campeonato e a terceira pior no ressalto defensivo – Bruce Brown já deixa muitas saudades a esta equipa. Durant, Simmons e Royce O’Neale são jogadores compridos com excelentes instintos defensivos, e Claxton móvel o suficiente para os permitir serem mais agressivos nas trocas e na busca de turnovers adversários, e será por aqui que os Nets serão melhores desse lado da bola.

Tudo isto, no entanto, é teorizar sobre a melhoria de uma equipa que claramente não atingirá o seu potencial enquanto não recuperar o seu jogador. Simmons tem estado a um nível globalmente fraco desde o seu regresso à competição, mas devemos dar um desconto à paragem superior a um ano; é perfeitamente normal ocorrerem leituras nos lances e tudo estar a acontecer um pouco rápido demais para os seus olhos – competir nunca é igual a treinar. Mas também não devemos ignorar a passividade, o esconder-se do jogo, as faltas desnecessárias (incluindo ofensivas e técnicas), e a gritante falta de confiança de quem não acredita em si quando tem a bola na mão. Esperemos que esteja a receber a ajuda necessária no capítulo mental do jogo, porque sem essa recuperação não voltará a atingir o nível que lhe conhecemos. E ficaremos todos a perder.

por LUCAS NIVEN [@lucasdedirecta]

Autor

Lucas Niven

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