Maldito «déjà vu»

por abr 22, 2022

Vamos falar sobre lesões.

Há cerca de um ano, houve um candidato ao título que nunca conhecemos. A sério. Uma equipa que prometia ser tão boa como as melhores da liga e que, durante os dez dias que a vimos jogar, comportou-se como tal. Não acreditam? Então vejam os lineups de quatro homens com maior plus-minus da NBA entre os dias 25 de Março e 5 de Abril de 2021:

Pois é. As cinco combinações possíveis de quatro homens de entre Jamal Murray, Will Barton, Michael Porter Jr., Aaron Gordon e Nikola Jokic foram… os cinco melhores lineups da liga inteira nesse período, dando tareias de pelo menos 14 pontos em cerca de dois períodos de jogo. Todos sabemos como acabou quase ainda antes de começar – vale a pena ouvir o monólogo do Zach Lowe, numa edição especial do seu podcast depois da notícia, em que faz um velório a uma equipa que ele, sem reticência nenhuma, apelidou de candidata ao título. Nem que seja para ver a eternidade que um ano representa nesta liga, quando às vezes tudo parece acontecer tão depressa

A lesão de Jamal Murray condenou os Nuggets no ano passado, e todas as épocas dá a sensação que na altura mais inoportuna, jogadores fundamentais se lesionam, e alteram a trajectória do título. Derrick Rose 2012. Chris Paul 2018. KD, e depois Klay, 2019, só para citar exemplos reconhecidos de equipas que já eram consideradas das favoritas a conquistar um anel. Muitos mais exemplos haveria.

Ora, não sei se já repararam, mas eu não tenho um estetoscópio à volta do pescoço. Não me cabe aprofundar os motivos pelo qual as lesões acontecem, ou se acontecem mais nos últimos anos, ou se acontecem mais a jogadores mais importantes – há um artigo do Baxter Holmes com o qual temos todos muito a aprender, e com o qual ficarão muito melhor informados sobre o tema do que comigo (a sério, leiam-no). Um pouco egoisticamente, por querer ver o melhor basket possível na altura mais importante do ano, interessa-me mais a consequência do que a causa, e ela é incontornável: estas lesões existem, por sorte, azar, ou pelo que seja, e parte da decisão do título acontece por causa delas.

O que nos traz a este ano. Foram o tema desta semana, quer pelas ausências de Devin Booker e Khris Middleton a curto/médio prazo, quer pelos possíveis regressos a breve prazo de Luka Doncic, Ben Simmons e Robert Williams. Neste carrossel de saúde e falta dela, onde os últimos desenvolvimentos são dados pelo Woj e pelo Shams como se do pico da Free Agency se tratasse, a fluida corrida ao anel deste ano parece mudar a cada dia que passa. Vamos respirar fundo, enfrentar este assunto meio deprimente, e perceber o impacto que estão a ter nesta postseason – e o que podem vir a ter no futuro. Com menções honrosas para o mencionado Jamal Murray, Michael Porter Jr. e Scottie Barnes, cujas desequilibradas séries a 3-0 me impedem de escrever coerentemente sobre eles.

(este artigo foi escrito antes dos jogos 3 que opuseram Suns aos Pelicans e Bucks aos Bulls)

Devin Booker

O horizonte: duas a três semanas ausente

Começamos com os Suns, donos do melhor registo da NBA na fase regular, e com o seu candidato a MVP. Booker lesionou-se na coxa durante o jogo 2 da série com os Pelicans, um estiramento de grau 1 que coloca o base cerca de três semanas de fora – o suficiente para garantidamente não regressar nesta série (jogo 7 no dia 30), e em dúvida para a segunda ronda, caso os Suns lá cheguem. Phoenix encontra-se de repente numa luta aguerrida contra New Orleans, que continua com a boa forma do último terço de temporada, tendo já roubado a vantagem caseira aos campeões do Oeste em título. Surpresa à vista?

Os Suns devem ainda ser considerados favoritos, mas é mais renhido do que se possa pensar. Têm um NetRtg (diferencial de pontos por 100 posses de bola) de +4.9 sem Devin Booker em campo; os Pelicans, num registo de 14-14 desde a troca de C.J. McCollum, apresentam uns respeitáveis +3.4. Com vantagem caseira, definitivamente temos série – não vale a pena pensar no impacto desta lesão lá mais para a frente – o problema existe hoje e chama-se New Orleans Pelicans.

Numa série em que o esquema defensivo preferencial é em ‘drop’, as trocas não estão a ser privilegiadas, e isto significa que o defensor de (presumivelmente) Cam Johnson terá a vida bem mais facilitada; Herb Jones passará a dedicar-se em exclusivo a Chris Paul. Enquanto que com CP3 em campo voltaremos a ter o mestre do bloqueio directo com trabalho extra, os minutos de Payne terão de ser acompanhados por alguma criação secundária, e é aqui temos problema: o melhor assistente na rotação em Phoenix depois destes senhores é… Mikal Bridges, um jogador infinitamente melhor e mais útil sem bola do que com ela. Teremos Aaron Holiday na série? É nesta altura que Dario Saric faz falta.

Este matchup, é bom lembrar em jeito de rodapé (daqueles maiorzinhos), tem outro all-star ausente por lesão: Zion Williamson. Enquanto o vemos afundar no aquecimento dos jogos e com notícias de que tem participado em jogos-treino “controlados”, é para já ausência confirmada, e a expectativa é de que não se conte com o big mac man este ano.

Khris Middleton

O horizonte: reavaliado em duas semanas

Por falar em jogadores importantes ausentes em campeões de conferência, Middleton. A lesão é num ligamento do joelho, com incerteza quanto ao grau. As de grau 1 demoram tipicamente duas semanas, as de grau 2 levam em média quatro a recuperar, num atleta de NBA (mais uns trocos para regresso à melhor forma em campo). Isto coloca o extremo de Milwaukee de fora contra Chicago, e em sérias dúvidas para a seguinte (outra vez, se lá chegarem).

Num paralelo que não termina aqui, também os campeões de Este já cederam um jogo em casa, e os Bulls cheiram o sangue na água. É mais difícil perceber o que vale em Chicago devido às muitas ausências ao longo do ano – Alex Caruso, Zach Lavine, DeMar DeRozan e Nikola Vucevic jogaram juntos sem Lonzo Ball apenas 190 minutos, tendo um saldo negativo de 30 pontos. Nesta série já o fizeram por 57 minutos. O saldo? +3. Os Bucks sem Middleton apresentaram na fase regular um NetRtg de apenas +0.3; esta série deve ser vista como extremamente renhida, e Chicago ‘só’ precisa de ganhar os jogos no United Center.

Os Bulls terão sempre que viver com a devastação que Giannis irá causar – Pat Williams está muito verde apesar de um excelente jogo 2, e Vucevic certamente não foi contratado para parar a maior força que a NBA tem hoje em dia. Mas no perímetro, há valor real em haver menos um jogador positivo dos dois lados da bola. De repente, falta um defensor para um de Zach Lavine ou DeMar DeRozan; do outro lado, há menos um homem capaz de criar o seu próprio lançamento com quem se terão de preocupar – enquanto Caruso poderá aterrorizar o portador da bola (e toda a equipa dos Bucks no geral), os grandes marcadores de pontos de Chicago poderão descansar algumas posses por jogo em frente a Pat Connaughton ou Grayson Allen na linha de triplo.

Num último paralelo (!), temos também outra ausência com retorno improvável: Lonzo Ball, depois de a meio de Janeiro se ter lesionado no joelho e ter um regresso previsto em dois meses, sofreu um revés na recuperação e falhará a restante temporada.

Luka Dončić

O horizonte: regresso iminente

Depois de um estiramento no gémeo atirar o génio esloveno para fora do início da série contra os Jazz, as últimas notícias são de que Dončić está a participar em treinos 5×5, foi visto a lançar no aquecimento do jogo 3, e pode estar de regresso a qualquer momento.

Com os Jazz ansiosos por não se terem que ver todos os dias no mesmo balneário (toda uma outra conversa para outra altura), os Mavs estão com vantagem de 2-1 na série, e uma derrota no próximo jogo trá-la de regresso a Dallas com a vantagem caseira conservada. A sensação é de que os Mavericks estão a comprar tempo com a recuperação de Luka, e com a vantagem adquirida, poderão ser cautelosos e não o utilizar no jogo 4 em Salt Lake City, por ser uma lesão que apresenta um risco de re-agravamento assinalável. Com os Suns envolvidos numa série que promete não ser curta e os Jazz numa espectacular implosão, Dallas de repente acredita que com a sua superstar a 100%, uma ida à final de conferência pode estar no seu horizonte. E podem não estar errados.

Robert Williams III

O horizonte: regresso iminente

Esta quinta-feira chegou uma grande notícia para os Celtics: ‘Timelord’, talvez a mais importante peça defensiva numa equipa que tem Marcus Smart no cinco e ausente desde o final de Março a contas com um problema no menisco, irá voltar o mais cedo que se previa, dado o quadro inicial de 4 a 6 semanas de paragem.

Boston transforma a sua situação de boa em óptima em excelente: já com 2-0 frente aos Nets, vê regressar um dos esteios da melhor defesa deste campeonato, e pode muito bem ser o favorito da conferência; na ronda seguinte, se tiver os Bucks pela frente, dificilmente haverá Middleton. Na série contra Brooklyn, pouco há a acrescentar a não ser dizer que oferece ainda mais problemas aos Nets, numa situação em que precisarão de ganhar 4 vezes em 5 a esta equipa. E por falar neles…

Ben Simmons

O horizonte: regresso… iminente?

Não poderíamos acabar esta lista sem o maior ausente-presente da NBA actual, o jogador que mais tinta fez correr no último ano sem ter um único minuto em campo para mostrar. Num desenvolvimento inesperado, surgiu a notícia de que o australiano poderia voltar no jogo 3 ou 4, antes de ser excluído do jogo deste Sábado, sendo o plano fazer a sua estreia no segundo jogo em casa dos Nets nesta série.

O que dizer do impacto deste regresso? Brooklyn está num mar de problemas, onde uma trituradora defensiva está a retirar quase tudo quase sempre a dois dos 5 ou 6 maiores talentos ofensivos da liga. Será provavelmente injusto pedir-lhe que volte no seu melhor, e a tempo de impactar esta série. Mas mantendo o status quo, a equipa de Brooklyn será com toda a probabilidade eliminada, por isso Simmons representa aquilo que pode ser uma mudança drástica de paradigma neste confronto.

Assumindo que o base volta a 75% para tornar este exercício útil, saberá Nash utilizá-lo? Se o utilizar com um de Drummond/Claxton será morte certa, ao brindar a defesa dos Celtics com 2 não lançadores ao mesmo tempo (e ainda há Bruce Brown). Mas… e se tentar soltar-se das amarras interiores de Al Horford e Robert Williams, e der o tudo por tudo com Ben Simmons num cinco com lançadores que sabem por a bola no chão, com Kyrie, Seth Curry, Bruce Brown e Kevin Durant? Provavelmente não resultará, mas desperta-me a curiosidade. Terão os Nets outra hipótese?

por LUCAS NIVEN [@lucasdedirecta]

Autor

Lucas Niven

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