Scouting report: Matas Buzelis

por jun 22, 2024

O valor posicional é inegável para um draft parco em extremos de qualidade, e torna-se ainda maior quando olhamos para aquilo que é a tape defensiva de Matas, com o seu combo de defesa versátil e protecção de cesto. Ofensivamente, para alguém que figurará como uma peça terciária a ampliar/finalizar vantagens, o seu pacote traz alguma intriga.

BIO

ANÁLISE DETALHADA

Atletismo

Extremo versátil, com limitações a nível da força e agilidade no espaço, mas que compensa com tamanho e um poder de impulsão que surpreende.

Buzelis é um big wing que apresenta um combo interessante de altura + envergadura – 2,11 metros e 2,09 m, respectivamente. Aliado a isso, é um daqueles ‘sneaky athletes’ que se move com velocidade norte-sul acima da média e que tem um bom poder de impulsão, com um load time rápido, especialmente quando faz a chamada com os dois pés.

É menos potente a fazer a chamada a um pé e perde muita mostarda a jogar no meio do trânsito. Aliás, jogar no contacto é uma das áreas onde mais claudica – Não tem um tronco muito forte nem uns ombros largos, o centro de gravidade é alto, tudo coisas que contribuam para que não seja funcionalmente forte.

É relativamente ágil a deslizar lateralmente e conter, o que o tornam numa ferramenta interessante a comer espaços, especialmente na defesa. Por outro lado, é um pouco duro de rins, tem dificuldade com mudanças súbitas de ritmo/direcção (ancas menos fluidas, perde equilíbrio com alguma facilidade).

Falhou os primeiros 3 meses da temporada 2023/24 da Ignite, devido a uma lesão no tornozelo e demorou algum tempo a ganhar ritmo, mas jogou até ao final da (desastrosa) temporada, sempre a rondar os 30 minutos.

Criação ofensiva

Extremo alto com alguma capacidade de criação e que num eventual tecto é uma opção drible/passe/tiro a ampliar e finalizar vantagens a partir da asa e canto, mas que precisa que o lançamento exterior se cristalize para que não se torne um impedimento em termos de encaixe.

Matas, que fez o seu nome como um criador com bola no HS, teve um papel bem mais variado na G-League, agindo ocasionalmente como portador, especialmente em transição e semi-transição, mas também como spacer/closeout attacker nos cantos, a receber bola em movimento a sair de bloqueios e até a criar ataque no poste alto. A USG% reflecte, mais ou menos, isso (21.4). Os números de eficiência, um pouco à boleia dos números @rim e de 3, sofreram num ano de adaptação de arquétipo (55.4 TS%).

A criar no perímetro, Buzelis está longe de ser um desequilibrador natural (Apenas 0.75 PPP em ISO, por exemplo), ou alguém que pressione o aro com agressividade (25.6% das FGs totais em 23/24 no pintado), tanto por características físicas como técnicas. Num plano físico, Buzelis é um jogador alto, com um centro de gravidade alto e um claro défice de força, tudo factores que lhe dificultam no momento de ganhar na força em penetração em drible. O próprio drible é algo solto/inseguro vs pressão e apesar de Matas ser versado em mudanças de direcção e velocidades (cross por trás das costas é *french chef kiss*), e se sentir tranquilo a conjugar diferentes crossovers, existe algum descontrolo de bola.

Dito isto, Buzelis é um driver frequente e com características positivas com bola, especialmente quando o ataque manufactura meia vantagem (DHOs, sair de pindowns, bloqueio directo). Tem um burst decente, uma passada super longa e uma afinidade para usar a carga de ombro em momentos de penetração em linha recta.

Para além disso, é um pequena fonte de counters (spins, step throughs, shot fakes), pivôs e passadas em desaceleração, qual Luka, que lhe abrem outras vias de separação, quando não ganha no primeiro momento.

O sucesso de Buzelis a atacar a partir da recepção da linha vai estar intimamente ligado com a sua capacidade para finalizar essas ocasiões no aro. Os números, para alguém com a sua altura/envergadura não foram ideais – 61.2% na área restritiva, 52% em layups, 26 afundanços.

Para além de não ser um desequilbrador nato, a falta de força de Buzelis faz com que frequentemente seja desalojado da sua trajectória e que facilmente perca o equilíbrio quando sobe para o layup. Tem alguma elasticidade no ar e o várias ferramentas técnicas para fazer os defensores morderem em fakes no aro, mas não tem grande burst vertical no trânsito, e é essencial um leaper a fazer a chamada a partir dos dois pés.

Não é um finalizador de uma mão só, e tenho alguma confiança de que se possa tornar num finalizador mais dentro da média, especialmente com o amadurecimento do tronco, que o pode ajudar a equilibrar o core e tornar o shoulder bump uma ferramenta ainda mais útil.

Muito relacionado com este último parágrafo está o jogo do ex-Ignite no poste intermédio. Matas está confortável a receber e enfrentar, usando a posição de tripla ameaça, os múltiplos counters que mencionei acima e o bom touch em ganchos para finalizar. Gosta de usar o fade de um pé de Dirk Nowitzki. Tenho as minhas dúvidas que alguma equipa vá desenhar jogadas para o lituano-americano no poste alto, mas Buzelis é um tweener, uma zona cinzenta posicional que vai marcar pontos a preencher espaços em momentos de vantagens ocasionais. Matas vai saber executar quando estes se proporcionarem, aqui.

No P&R, Buzelis teve um ano um pouco desapontante.  É certo que não teve assim tantas oportunidades (43 posses com BH o ano inteiro), mas o wing da Ignite denotou dificuldades a processar todas as nuances do bloqueio directo (0.8 A:TO ratio) e a encontrar a trajectória de penetração, ou o passe certo. Apesar de ser alguém que tem um bom controlo de ritmos, as limitações no drible dificultaram no primeiro momento de penetração e até na utilização do bloqueio em si. Teve bons números no jogo intermédio, mas falta subitaneidade no momento do disparo a partir do drible (32% em todos os pull up jumpers).

Não é um Ron Holland, mas é um jogador muito competente em transição, seja a ressaltar e transportar, seja a fazer o leak out e correr à frente da jogada para oferecer uma linha de passe. É alto e tem boa impulsão a subir para afundar. 1.13 PPP neste tipo de jogadas em 2023/24.

Passe

Passador-conector com bom entendimento de jogo em situações de ataque inclinado, mas cujo A:TO ratio negativo e tape indicam falta de visão.

As deficiências de Buzelis no processamento não são circunstanciais, parece-me – Já em 22/23 teve um A:TO ratio sub 1.0, num papel ofensivo de ballhandler principal, que não foi o caso na Ignite. Algo evidente é que Matas não cria separação com facilidade no 1v1, nem colapsa o pintado, consequentemente não abrindo linhas de passe fáceis para si próprio.

Ainda assim gosto do processamento. Num ambiente ofensivo quase irrespirável, foi capaz de unir os pontos e fazer passes com relativa agilidade no halfcourt (atacar closeouts, momento de recepção após o pop ou o corte) e especialmente em transição. Gostava de o ver utilizado um pouco mais criativamente, como DHO hub ou short roller, por exemplo. Sinto que existe algum potencial por destapar, especialmente se o físico lhe permitir ser um 4 a tempo inteiro.

Não tem uma técnica soberba, mas a sua altura permite-lhe ver por cima da defesa no ponto de ataque e até ter um campo de visão limpo quando, por exemplo, rola para o cesto contra a 2ª linha de defesa.

A visão não é grande coisa e é quase estritamente um passador reactivo. É bom no drive and kick, mas insiste constantemente nesse passe, mesmo quando esse passe é para o lado forte e bem defendido, muitas vezes negligenciando passes mais simples para o dunker spot, onde tem um big a espera. Falha linhas de passe óbvias com alguma frequência.

Lançamento e Ataque sem bola

Alguém que entrou na temporada 2023/24 com o rótulo de atirador (43.1% de 3 no ano de senior no HS) e uma bonita mecânica, mas que sai da mesma com várias questões.

Como usual, olhando para os números crus de Buzelis – 45.3 FG% (11.8 FGA), 25.9 3PT% (3.4 3FGA) e 69.6 FT% (2 FTA).

Catch and shoot 3s29.4% (68 FGAs)
Pull up jumpers32.1 % (56 FGAs)
Uncontested 3s35.7% (14 FGAs)
Total jumpers32.2% (174 FGAs)
Touch shots46.4% (84 FGAs)

Quase todos os indicadores de lançamento são preocupantes, começando pela linha de lance livre e acabando nos pull ups. Neste último, talvez a falta de fluidez do drible e de rotina a ‘colocar os pés por baixo do corpo’ para subir e disparar influenciem a má conversão, mas isso não explica bem os sub-35% quando filtramos para todos os jumpers fora da área restritiva.

O jumper, mecanicamente, não é, de todo, mau, o que adiciona intriga aos altos e baixos que Buzelis tem tido de 3 pontos na sua curta carreira.  Tem um release muito alto e um dip algo pronunciado no momento da recepção, o que torna a motion mais lenta. Não há grandes mudanças de tiro para tiro, mas tem uma base mais estreita que o usual (pés muito juntos). Não tem uma boa transferência de energia (alguns short rims), o que me leva a acreditar que parte do insucesso tem a ver com a adaptação súbita a uma linha de 3 mais distante – é um datapoint a ter em conta na sua temporada de rookie, ver como é que a sua conversão de longa distância progride ao longo do ano.

Tem alguns bons indicadores estatísticos, nomeadamente em touch shots (floaters, hooks, runners), bem como a lançar de meia-distância a partir do drible. São indicadores positivos para alguém cujo papel na liga vai depender muito da sua capacidade de espaçar o campo, mesmo que nunca seja mais do que um atirador de volume e aproveitamento mediano. Se o triplo nunca cair, é viável que Matas seja o atacante secundário a partir da posição 4? Se não for possível, como contornar a falta de espaçamento? É como smallball 5 pontual? Torna-se difícil que seja top-5, se o último se tornar realidade. 

No ataque sem bola, Buzelis brilha, mesmo sem um triplo consistente. É aqui que a sua maleabilidade e perspicácia a preencher vazios realmente sobressaem. É um cutter superinteligente (1.38 PPP em cuts), seja na baseline ou em zonas mais frontais do campo, sabe ler perfeitamente o defensor e tem o timing certo para atacar espaços vazios. A explosão vertical súbita ajuda-o a finalizar com mais facilidade após a recepção.

Com a sua capacidade para cortar, atacar closeouts em drible e fazer o passe simples, encaixaria que nem uma luva num sistema ofensivo um pouco mais motion heavy e de partilha de tarefas de ballhandling – Apesar de ser efectivamente um mau bloqueador, tenho alguma curiosidade de o ver mais envolvido em acções de bloqueio directo (bloqueio e pop ou roll), coisa que não aconteceu muito na Ignite.

Por fim, e apesar das limitações de força, é alguém que oferece valor em jogadas de insistência, como ressaltos ofensivos e putbacks (1.33 PPP).

Ressalto

Ressaltador com uma produção respeitável, mas não muito mais do que isso, tanto na tabela defensiva (17.1 de DReb%), como na tabela ofensiva (5.5 de OReb%).

Como um 4 sub-desenvolvido muscularmente e com uns ombros não muito largos, não há grande precendente histórico que indique que se possa vir a tornar um ressaltador ++, especialmente se tivermos em conta outros traços atléticos. Ainda assim, Buzelis consegue compensar com bom posicionalmente, mas mais do que isso, bom motor e um bom segundo salto. Sai fácil e rápido do chão.

Defesa individual

Defensor de perímetro com bons fundamentos, com o tamanho para se manter à frente de alguns extremos, mas que vai ter dificuldades contra bases mais explosivos e wings fortes. Precisa de chegar a uma certa linha de base no ponto de ataque para que a sua defesa colectiva o torne um positivo mais claro. Pontos por posse cedidos, em diferentes tipos de jogada:

Catch and drives0.84 PPP (73 FGAs)
Isolation0.91 PPP (47 FGAs)
P&R Handler0.89 PPP (36 FGAs)
Hand offs0.69 PPP (26 FGAs)
Post up1.13 PPP (23 FGAs)

A defender o portador, Matas é competente a deslizar lateralmente (3 – 5 passadas) e conter penetração em linha recta. Tem boa antecipação e corta a trajectória, oferecendo o peito para absorver contacto. Para alguém com um claro défice de força posicional, não evita momentos mais físicos e é capaz de voltar à jogada para tentar desarmar, mesmo após levar uma carga de ombro forte. Mantém as mãos ao alto, afectando a qualidade do lançamento oposto, evitando, ao mesmo tempo, fazer faltas tontas. Disciplinado, força uma boa quantidade de deflections apenas por estar no sítio certo.

Sofre mais a conter explosão e portadores mais shifty, que recorrem a mudanças de direcção e o obrigam a viras as ancas para se manter enquadrado. É duro de rins, tem um centro de gravidade alto e agacha-se pouco na stance vertical, tudo coisas que contribuem para que perca equilíbrio com facilidade.

Também por causa disto, é bastante mau a navegar bloqueios. É desengonçado no momento de minimizar o volume do seu corpo e há vários casos onde simplesmente não tem a percepção visual do bloqueio e esbarra contra o adversário quando está a defender o BH, forçando a sua equipa a trocar acções de bloqueio que não são favoráveis, de modo a não oferecer pontos fáceis no primeiro momento. Por outro lado, tem bons momentos enquanto big no P&R, especialmente em drop. Não que tivesse sido algo frequente em 2023/24, mas gosto geralmente do posicionamento, da paciência e timing no momento de contestar.

Defesa colectiva

Uma dos seus verdadeiros positivos – alguém com um afiado e inteligente entendimento de jogo, com um impacto significativo como protector de cesto secundário a vir do lado fraco – 1.9 blocks e 0.9 steals na G-League.

Com jogadores como Izan Almansa e Tyler Smith no miolo, Buzelis foi usado maioritariamente como 4, defensivamente, a defender o atirador no canto oposto e a agir como low man.  Nem sempre teve total liberdade para ser o joker defensivo a voar pelo campo, mas a sua constante presença como segundo protector de cesto foi um dos poucos pontos coloridos de uma defesa bem cinzenta da Ignite.

Neste papel, Matas demonstrou não só bons fundamentos (timing certo a ler a penetração e saber quando aparecer para contestar), mas também boa presença. Apesar de não ter uma envergadura por aí além, tem boa standing reach e óptima técnica de verticalidade, fazendo-se parece maior do que aquilo é, alterando muito mais lançamentos do que os que efectivamente bloqueou. O bom poder de impulsão contribui muito positivamente para isso.

Mesmo fora disso, o extremo tem um bom entendimento do flow ofensivo do adversário, segue as jogadas, joga bem na nail e faz tags com timing quando o big rolla para o cesto. Apesar de não ter umas mãos ‘violentas’, usa-as com nuance para sacar roubos de bola e deflections que atiram areia para a engrenagem.

A pior micro-habilidade aqui é mesmo a sua capacidade de efectuar closeouts sólidos de forma constante. Não tanto por perder a noção de onde está o defensor directo quando ajuda, mas mais por ter dificuldade a fechar na linha de 3 em velocidade e manter o equilíbrio (de novo, muito vertical, centro de gravidade afecta o equilíbrio, permite penetração meio).

Ponto final, parágrafo

Muito mudou desde o dia 6 de Setembro de 2023, quando a Ignite enfrentou pela primeira os Perth Wildcats num showcase duplo entre os três dos melhores talentos do Draft de 2024. Agora, às portas do dia D, a Ignite é um projecto que já não existe e Buzelis e Holland não são nomes inequívocos para o topo desse mesmo draft.

A Ignite teve o seu pior ano colectivo e acabou por terminar como projecto, e Holland e Buzelis, com lesões pelo meio, tardaram a encontrar-se como jogadores, enquanto navegavam um jogo diferente, com linhas diferentes, com ritmo diferente e com um threshold atlético muito superior. A coisa foi pior para o último, que era para muitos um suposto lead ballhandler, mas que nunca conseguiu gerar ataque fácil nem para si nem para ninguém.

Talvez tenha sido um problema de percepção, porém. O aliciante com Buzelis ainda é forte o suficiente para o manter no meu top 5-6 – O valor posicional é inegável para um draft parco em extremos de qualidade, e torna-se ainda maior quando olhamos para aquilo que é a tape defensiva de Matas, com o seu combo de defesa versátil e protecção de cesto.

Ofensivamente, para alguém que figurará como uma peça terciária a ampliar/finalizar vantagens, o seu pacote traz alguma intriga. Aquilo que mostra a decidir rápido, mover-se sem bola e até a atacar em situações vs defesas inclinadas agrada-me, tal como me agrada o facto de quase todas as suas deficiências, sejam elas técnicas (drible, agressividade) ou físicas (falta de força, agressividade) serem mais do que tratáveis a partir do momento em que entrar na NBA.

O seu lançamento exterior, historicamente incerto com ele, é o factor decisivo para o sucesso. Um jogador que se quer um role player de excelência não pode introduzir entraves num ataque, quando está lá para o optimizar. Se o tiro não cai, tornar-se-á difícil perceber como é que devolve valor de high lottery e que tipo de jogador é ele sequer. Paciência e criatividade serão critérios fundamentais para fazer Buzelis vingar, para quem quer que o escolha.

Autor

Nuno Soares

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