Crónica de uma viagem à NBA Summer League

por ago 2, 2024

“E esta é a tua introdução aos Estados Unidos?” foi a pergunta que mais ouvi na minha viagem de cerca de seis dias a Las Vegas. A cidade do pecado é extravagante, caminhando numa fina linha entre o luxuoso e o mau gosto. Mas Las Vegas é também a casa da NBA Summer League, motivo pelo qual me desloquei ao Nevada.

Confesso que ver jogos de basquetebol, embora sempre agradável, não estava no topo da minha lista – ou de 90% das pessoas presentes no Thomas & Mack Center. A Summer League é um evento de networking onde cada pessoa presente tenta alcançar o sonho de chegar à NBA, desde treinadores a jogadores, passando pelos diferentes constituintes de um front office. Por entre os corredores do Thomas & Mack, com acesso ao Cox Pavillion (o pavilhão secundário), foi comum ver-se pessoas com polos identificativos da organização da NBA a que pertencem, reunidos com jovens aspirantes a chegarem à principal liga do basquetebol mundial. Uns mais sorridentes, outros visivelmente cansados de tanta comunicação.

No meu caso foram cinco dias dentro da arena, aos quais se acrescentam os dias de chegada e partida que não são fáceis de esquecer pela dificuldade que uma viagem de Portugal à outra extremidade dos Estados Unidos pressupõe. A Summer League obriga a uma preparação prévia: a criação de uma lista de pessoas que se deseja conhecer e o contacto anterior à aterragem no tórrido pavimento do Aeroporto Harry Reid. Porque toda a gente quer falar com toda a gente e não há horas suficientes num dia – nem sequer em Las Vegas – para satisfazer todos os pedidos. As conversas obrigam também a um constante estado de atenção e uma capacidade tremenda para manter uma conversa com alguém que se conheceu há cinco minutos. Não só manter a conversa, mas também não fazer o outro pensar que está a perder tempo. Tudo isto para manter viva a ínfima possibilidade de garantir um lugar numa organização da NBA.

Por entre o pavilhão e os hotéis, chega a surrealidade das pessoas que se vêem nas bancadas, nos corredores, nas mesas de jogo ou nos restaurantes… Nunca pensei estar a assistir a uma partida de basquetebol numa bancada a três cadeiras de distância do ex-árbitro Joey Crawford. Ou de ver Ayo Dosunmu e Juwan Howard a chegarem ao casino numa noite de quinta-feira. Ter Udonis Haslem a gravar um programa para a ESPN num estúdio improvisado a meros metros de uma banca de venda de cachorros quentes e pipocas ou a parada de estrelas que se sentava nas cadeiras junto ao campo para assistirem aos mais jovens das suas respectivas equipas. A Summer League faz-nos perceber os diferentes níveis de importância associados à NBA, mas todos se encontram ali, no mesmo local. Seja no pavilhão, ou nos hotéis.

Quanto ao basquetebol jogado, não há muito a acrescentar na realidade. Porque, tal como referi anteriormente, não está no topo da lista de quase ninguém ali presente. É uma boa oportunidade de observar os rookies num ambiente diferente. Um ambiente onde Reed Sheppard e Matas Buzelis me impressionaram sobremaneira. É também onde podemos começar a perceber quem se encaixa nas suas equipas e quem começa a ver o comboio a fugir – Karlo Matkovic e Tristan Vukcevic vão colecionar muitos minutos pelos Pelicans e Wizards, respetivamente. E é também uma excelente oportunidade para ver o campeão Neemias Queta, um poste que dominou sem grande problema nos dois jogos em que participou pelo nível superior que apresenta relativamente aos seus opositores. Esperemos que esta tenha sido a sua última presença neste evento, visto que já ultrapassou há algum tempo o seu nível.

Não poderia esquecer também o momento em que a arena principal, que alberga cerca de 18 mil pessoas, encheu para ver o jogo entre Houston Rockets e Los Angeles Lakers. Uma enchente que se explica, obviamente, pela presença de um tal de Bronny James, embora Reed Sheppard tenha roubado a atenção de toda a gente. E o momento a seguir, em que cerca de metade dessas pessoas abandonaram os seus lugares mal soou a buzina, pouco interessadas num confronto entre Zaccharie Risacher e Alexandre Sarr, primeira e segunda escolhas no draft de 2024, respetivamente.

No meio de temperaturas bem acima dos 40 graus, mesmo durante a noite – sim, o calor seco custa na mesma – a incrível capacidade dos ar condicionados de hóteis e arena são de salutar. A luz constante, o imparável som das slot machines e as pessoas maioritariamente idosas que não as largam e as personagens que dão cor às ruas de Las Vegas fazem daquela cidade algo sem igual e da NBA Summer League um momento anual procurado por aqueles que querem fazer parte da NBA e já temido por aqueles que têm de lá estar presentes todos os anos, mas tentam fugir passados uns dias.

A Summer League é um evento onde a conexão com as pessoas vem primeiro. São oito a dez horas diárias dentro de um pavilhão numa procura constante pelo melhor caminho de chegada à liga. E isto não inclui os almoços, jantares e até pequenos-almoços de networking, as palestras e alguns eventos criados exatamente para esse efeito. Sobram as poucas horas para dormir e as saídas para bares, discotecas ou casinos para quem tem dinheiro para tal. O basquetebol, esse, está no centro de tudo mas acaba por ficar perdido aí mesmo, quando todos se movimentam nas periferias.

Autor

António Dias

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