Quem me conhece sabe que detesto perder mais do que gosto de ganhar, essa é a minha mola diária para a superação no trabalho.
(Continuação do prólogo)
Já é público e conhecido que deixei a Roménia, face aos graves problemas financeiros do clube e da consequente extinção da equipa, estando presentemente em Portugal. Porém, porque está crónica estava feita e porque contém questões intemporais decidi ainda assim mantê-la.
Tomada que estava a decisão, ainda assim não foi fácil executá-la, como por certo imaginarão. Quando mudamos tão radicalmente de projecto de vida, há sempre um sentimento de perda, fica sempre a ideia de que deixamos algo para trás.
Mas o sonho comanda a vida e em Agosto de 2013 mudava-me de armas e bagagens para Værløse-Copenhagen. Dar continuidade ao projecto de seniores deste clube e potenciar as jovens da sua formação era a prioridade, visto que o clube não abundava em dinheiro (uma espécie de sina minha)… Cedo, porém, dei conta dos primeiros obstáculos. Ter as jovens de formação do clube a tempo inteiro era impossível e treinar bi-diário uma verdadeira utopia. Este amadorismo tornou-se uma autêntica muralha, quase intransponível, fruto de uma cultura nórdica tão própria e diametralmente oposta à latina. Os níveis de superação e sacrifício eram ínfimos, porque basicamente assim se educa por aqueles lados. Um hobby é um hobby e ponto final. Ou entretém ou se abandona…
Recordo um episódio curioso, no final da minha primeira derrota em casa, de ter terminado o jogo e, assim que acabei de falar com as atletas, saí disparado do pavilhão para casa. No dia seguinte tinha o presidente a chamar a minha atenção para o facto de não poder ser tão intempestivo e de ter forçosamente de ter sempre uma atitude positiva mesmo na adversidade.
Quem me conhece sabe que detesto perder mais do que gosto de ganhar, essa é a minha mola diária para a superação no trabalho.
Foi, não obstante, uma espécie de epifania que viria a mudar-me nessa componente de treinador. Foram dois anos a derrubar barreiras e mover montanhas de tal forma que, findo esse período, estava exausto mas, ao mesmo tempo, diferente, para melhor, creio e espero eu.
No Verão de 2015, e depois de ter sido terminado o projecto onde trabalhava, vi-me num período de alguma indefinição e foi então que surgiu um convite da Roménia para trabalhar em Galati, mais concretamente no CS Phoenix.
É da mais elementar justiça salientar que este convite surge por intermédio do meu bom amigo e companheiro de tantas lutas por essa Europa fora, José Araújo. Ele estava na altura em Arad e foi fruto da sua enorme e inquestionável competência que acabou por se abrir mais uma porta ao treinador Português.
E basicamente mudei da “água para o vinho”. Entrei numa realidade 100% profissional, num clube onde, apesar da melhor prestação ter sido o 8.º lugar, existia a tempo inteiro um “club manager”, “team manager”, dois treinadores, fisioterapeuta, ginásio para musculação, escritório.
Um pavilhão top, exposição mediática, conferências de imprensa antes e depois dos jogos, enfim, uma parafernália de questões paralelas que raramente verificamos no sector feminino. A necessidade de conviver no meu dia a dia com estas questões paralelas sem que perdesse o meu rumo. A teimosia e a crença quase inabalável no trilho do meu trabalho, às vezes contra “ventos e marés”, ganhou aqui os alicerces que faltavam neste puzzle, que é a vida de um treinador.
Ter a capacidade de se questionar todos os dias é um ato de inteligência que só nos fortalece, ou porque mudamos aquilo que não gostamos ou porque solidificamos a parte que damos como correcta.
Parafraseando um dos melhores treinadores portugueses da atualidade, de quem tenho a honra e a rara felicidade de ser amigo, Ricardo Vasconcelos, “ouvir, ouço todos, ainda que a alguns não reconheça a capacidade de mudarem o meu mundo”.
Ter a coragem de ouvir aqueles que nos contradizem e agradecer por serem um contraponto às nossas ideias deverá ser um lema para qualquer profissional, seja ele jovem ou jubilado.
Três anos volvidos acabei por deixar o CS Galati, por razões financeiras, já que o clube decidiu extinguir a equipa feminina. O corte no apoio camarário a isso levou e, como tal, vi-me na contingência de regressar antecipadamente, sendo que o futuro é e será sempre uma incógnita nesta vida de treinador.
Não sei quantos chegaram ao final desta crónica, mas a todos sempre direi que nas minhas próximas linhas tentarei deixar “estórias” sobre o basquetebol e afins, umas divertidas, outras nem por isso, mas sempre na ânsia de trazer mais gente apaixonada para este desporto.
Até lá, bons treinos e divirtam-se a jogar.
por EUGÉNIO RODRIGUES