Fomos à bola (laranja) de cristal e vimos as Estrelas, Vol. I

por jan 21, 2022

Não dá para fugir ao tema, é uma daquelas alturas em que todos temos a nossa lista bem feitinha, em que passada mais de meia época conseguimos dizer com clareza quem tem brilhado mais alto na NBA, e afiançamos com toda a certeza que os nossos All-Stars são os completa e irrevogavelmente certos, e os vossos são uma opção ridícula e devem estar loucos por discordar da nossa escolha.

Como a equipa do Borracha Laranja é composta por dez cabeças duras que mais depressa negociavam a paz no Médio Oriente do que concordavam todos nos titulares do jogo grande que vai ter lugar em Cleveland (experimentem dizer Trae Young na presença do Ricardo Brito Reis e vejam o pelo do cachaço do homem a eriçar), fizemos o que as pessoas crescidas fazem numa democracia – fomos a votos (por falar nisso, ide lá no dia 30, seus cidadãos).

O que se segue é o resultado desse bonito processo democrático, que é a lista de titulares para o jogo do All-Star que se avizinha e cuja votação (a real, que decide de facto os titulares apesar de ser ligeiramente menos importante que esta) termina amanhã, dia 22 de Janeiro. Falaremos dos suplentes na próxima newsletter, mas uma vez que só serão anunciados em Fevereiro e precisamos de conhecer antes os titulares, não há pressa. Parafraseando uma antiga glória da formação do Montijo: “Vamos a isto? ‘Bora.”

Conferência Oeste – Backcourt

Steph Curry, Golden State Warriors, 10 votos

Ja Morant, Memphis Grizzlies, 10 votos

Começamos pela parte fácil: nem uma alminha desta equipa que semanalmente vos escreve escolheu outro atleta que não Steph ou Ja para representar o Oeste como base; e se a unanimidade de Curry dificilmente gerou surpresa, o mesmo resultado para Morant suscitou um ‘Wow’ aqui na redacção virtual (o voto foi, obviamente, secreto. Não andamos aqui a brincar).

Ja Morant, como dizem lá na América, passou oficialmente a ser UM PROBLEMA. Líder na corrida a MIP e a entrar na de MVP nas últimas semanas (perguntem ao Draymond Green), é a ponta da lança de uns Grizzlies que estão com um assombroso registo de 22-5 depois de um início tremido (e com a pior defesa da liga) de 9-10. São terceiros no Oeste, perseguindo apenas Suns e Warriors. Mas este contexto todo é secundário quando vemos Ja a jogar basket, noite após noite após noite. A mixtape dele em meia época… bem, é desfrutar:

Não há jogador que nos faça ir ao League Pass mais depressa, que pegue fogo ao Twitter tão facilmente em apenas um lance, que nos faça questionar se a definição de ser humano se aplica da mesma maneira a nós e àquele fenómeno atlético. É o bilhete mais bem pago da NBA actual, e é também para isso que o All-Star existe.

Steph é tão inevitável como foi o record de triplos ter caído às suas mãos. Deu continuidade à forma insana com que terminou a temporada passada, a química com Draymond Green está como um vinho na altura ideal para ser degustado, e o resultado foi ter liderado a corrida a MVP na maior parte das opiniões durante a primeira parte da temporada, mantendo intacta a capacidade para em qualquer noite ser a maior arma ofensiva que existe no campeonato.

Dada a unanimidade, deixo aqui rapidamente as menções honrosas antes de seguirmos em frente: Dejounte Murray e SGA, silenciosamente a fazer épocas de nível altíssimo em equipas medíocres e sem apelo para terem muitos olhos em cima delas; CP3 e Devin Booker, parceiros no ‘crime’ que é co-comandar a melhor equipa da NBA, sem espectacularidade mas com a eficiência do costume; e Donovan Mitchell e Luka Doncic, que se apresentam em boa forma a liderar as suas equipas no ataque, apesar de algum sentimento de ‘estagnação’ nas suas equipas.

Conferência Oeste – Frontcourt

Nikola Jokic, Denver Nuggets, 10 votos

LeBron James, Los Angeles Lakers, 9 votos

Rudy Gobert, Utah Jazz, 5 votos

Também receberam votos: Draymond Green (2), Paul George (2), Karl-Anthony Towns (1), Anthony Davis (1)

Ninguém no seu perfeito juízo se atreveria a deixar o MVP de fora do seu elenco, e por aqui é só gente ajuizada; não há mesmo muito a dizer, quem terá que apresentar justificações é quem achar boa ideia não o colocar no seu boletim. É, na minha opinião, simplesmente o melhor basquetebolista do planeta, o único jogador capaz de largar um 49-14-10 como fez na passada quarta-feira e não gerar grandes reacções na blogosfera. Porque é normal. É normal para Jokic ter uma segunda parte com 37 pontos, carregar um plantel em que os melhores activos (no… activo, pelo menos) são Monte Morris, Aaron Gordon e Will Barton, para mais uma vitória rumo aos playoffs. É normal saber cada passe do livro, e ainda ir adicionando mais uns capítulos da sua autoria, como na posse de bola crítica desse jogo:

https://twitter.com/BleacherReport/status/1484040404026724353?s=20

Tudo isto é normal, porque falamos de Nikola Jokic, e só por isso.

Nós sabemos como vai acabar a luta contra o Tempo que LeBron James está a travar há uns anos. Nunca ninguém ganhará ao Tempo, que permanecerá infinitamente invencível, mas terá que aplicar um KO a LBJ para esse dia chegar, porque para já este vence o combate categoricamente por pontos. Enquanto o sino não toca, nada como mais uma reinvenção na carreira do King: depois de ter sido campeão há menos de um ano e meio a jogar maioritariamente como base e distribuidor de jogo da equipa, por que não ser agora uma das melhores presenças interiores do campeonato, tentando salvar a defesa da sua equipa e continuando a fazer de tudo um pouco no ataque para a manter à tona? Sim, por que não?

O homem é absurdo, e não há muito mais a dizer senão reforçar o privilégio que é acompanhar esta carreira de ponta a ponta. Aos 37 anos, venceu mais um round.

Rudy Gobert levou a nossa última vaga para o frontcourt do Oeste, no voto que reuniu menos consenso na Conferência (a redacção do Borracha Laranja está em condições de avançar que não, não será Andrew Wiggins). Todos conhecemos o caso pró- vs anti-Gobert: é um dos dois ou três melhores defensores da Liga vs as equipas têm tendência a explorá-lo em small ball; define a identidade dos Jazz, uma das equipas mais consistentes e que melhor joga nos últimos dois ou três anos vs essa é uma identidade aborrecida e que em nada contribui para o espírito e o que se quer de um jogo All-Star. Quem me lê agora está num destes campos e o mais certo é não mudar a opinião independentemente do que leia. E tudo o que escrevi pode ser (e provavelmente é) verdade, e está tudo bem! O que permanece indiscutível é que de facto é um defesa geracional, e o sucesso no passado recente de uma grande equipa está directamente correlacionado com o seu crescimento e sucesso pessoais. As suas estatísticas avançadas são do outro mundo, como habitualmente, e os Jazz que estão com um registo de 28-12 com o francês, estão 1-4 sem ele – com as derrotas a registarem uma margem média de 16 pontos, incluindo frente a Pacers e Pistons. Deixem jogar o ‘Baguetes’.

Os maiores candidatos à vaga ocupada pelo poste de Utah segundo a nossa votação foram Draymond Green e Paul George, ambos a contas com lesões por estes dias, e deverão ocupar vaga nas reservas. Dray é o yang para o yin de Steph: é a alma e a voz da equipa, transformando os Warriors na defesa gesticulando para os quatro colegas uma posse de bola de cada vez. Mas não é só isso, explica o Diogo Santos: “Posso estar a ser velho do Restelo, mas o All-Star Game precisa de jogadores como ele – atletas com uma mistura assinalável de bazófia, espírito competitivo e, vá lá, algum jeito para jogar basquetebol. É a cola de uma das melhores equipas da Liga e talvez um dos poucos que vai transpirar nos últimos minutos do jogo em Cleveland”. Paul George começou o ano na conversa para MVP, como nota o António Dias, justificando o seu voto: “Muito bom início de época, vai mantendo os Clippers na luta pelos playoffs enquanto não há Kawhi, com um elenco que não é forte”.

KAT e AD, que também receberam votos, deverão ter que esperar pelo anúncio das reservas para saber se vão passar o fim de semana a Cleveland e voltar a ser All-Stars. Deandre Ayton e Kristaps Porzingis, a atravessar um óptimo momento em Dallas, são outros que alimentam alguma esperança.

Conferência Este – Backcourt

DeMar DeRozan, Chicago Bulls, 10 votos

Trae Young, Atlanta Hawks, 5 votos

Também receberam votos: James Harden (2), LaMelo Ball (1), Zach Lavine (1), Tyler Herro (1)

Primeiro, o óbvio. Longe vão as dúvidas sobre a compatibilidade das muitas caras novas nos Bulls: Billy Donovan trouxe a experiência que promoveu em Oklahoma City de passar largos períodos do jogo com três bases em campo, e se a defesa era um enorme ponto de interrogação no início do ano, uma avalanche de actividade, pressão e agressividade no perímetro trataram de, no mínimo, amenizá-las. À cabeça deste ressurgimento de Chicago que co-lidera a Conferência está, claro, DeMar DeRozan. Depois de ser o ‘outro’ na troca que fica para a História como aquela que levou Kawhi para o Canadá, DeMar rumou ao Texas, e longe das luzes numa equipa perfeitamente anónima, não parou de refinar o seu jogo: deixou de ser um lançador ineficiente de dois pontos, e passou a ser um fenomenal passador após a penetração, mantendo a incrível taxa de ida à linha de lance livre. Agora que volta a estar debaixo dos holofotes, aplica todo este processo a uma equipa que aposta muito em small ball, tendo assim mais condições que nunca para o fazer numa meia distância que é o seu escritório e onde nunca teve tanto espaço para operar – persegue apenas Giannis em pontos por jogo no quarto período dos encontros e tem sido um assassino a fechá-los.

A segunda vaga reuniu uma boa quantidade de nomes diferentes na nossa votação, tendo metade de nós optado por Trae Young. Primeiro, os contras: os Hawks estão numa situação muito difícil na Conferência Este, correndo o sério risco de ficarem de fora até do play-in, um ano após ter sido a surpresa da liga ao marcar presença na final de Conferência (e é o nosso único eleito fora de uma posição de, pelo menos, play-in); a maior culpa dessa queda é a defesa da equipa, na qual Trae está longe de estar isento de culpas. Por outro lado, é justo perguntar onde estariam estes Hawks sem Trae Young: se é verdade que Atlanta sem ele em campo têm o equivalente à 20ª pior defesa da liga e se transforma na pior com ele, o ataque com Trae na quadra produz mais que o melhor ataque da liga, e sem ele afunda-se para um 28º, sendo o seu diferencial On/Off de 5.4 pontos por 100 posses de bola, uma margem muito saudável numa equipa globalmente medíocre. Muito se pode escrever sobre esta dualidade, mas uma coisa é certa: como mostram os casos em Memphis e Golden State, a coisa tem que funcionar com um prodígio ofensivo ao leme apesar das suas limitações defensivas, a questão são os restantes ajustes. E o jogador que entrega 52 pontos à equipa todas as noites através dos seus 28 pontos e 10 assistências está a fazer a sua parte. E convenhamos, mesmo que não agrade a todos (corrijo: precisamente por não agradar a todos), a persona do vilão que começou a criar o ano passado em NY é daquelas que faz falta à festa.

De fora da nossa equipa titular fica este ano James Harden. “Com DeRozan fechado, a dúvida foi entre Trae, VanVleet e Harden. Escolhi o último pelo contexto – praticamente 23/8/10 esta temporada (incluindo incríveis 26/8/11 desde o Natal) e a liderar a liga em assistências, mantém os Nets no caminho das vitórias apesar da constante pressão mediática, o status de Kyrie e agora, a lesão de KD”, defende assim o Ricardo o seu voto no Barbas, que destaca ainda Garland como um nome que merece destaque de entre os que não foram votados por nós. 

All-Star Game, se escutarem com atenção, rima com LaMelo Ball, algo que não foi indiferente ao Diogo, dizendo que “é um dos jogadores mais excitantes da competição, torna os Hornets uma das equipas mais divertidas da liga sozinho – e tem números respeitáveis, não é só show. E se fosse só show, estávamos mais do que conversados”. Reuniram ainda votos cá na casa Zach Lavine e Tyler Herro. Enquanto o Zé Volta e Pinto nem disfarçou a costela caseira ao promover um duo de Bulls à titularidade da equipa, o Luís Cristóvão faz questão de deixar o apelo a que se juntem a ele na campanha por Tyler Herro: “eu sei que vai parecer quase uma traição às opções convencionais escolher um sexto homem para titular no All Star, mas este é um ano para tomar decisões difíceis. Herro tem sido dos jogadores mais inspirados esta temporada e às vezes é preciso pensar com as emoções, e enquanto não nos deixam lá meter o Neemias, vote for #TylerHerro!”

Conferência Este – Frontcourt

Kevin Durant, Brooklyn Nets, 10 votos

Giannis Antetokounmpo, Milwaukee Bucks, 10 votos

Joel Embiid, Philadelphia 76ers, 10 votos

Terminamos como começámos: todos de acordo. Nem um dos trinta votos disponíveis fugiu aos três candidatos a MVP, numa destruição total e completa da concorrência. Para Kevin Durant, a lesão no Aquiles é já uma memória distante, um asterisco no seu historial, e um dos melhores e mais completos jogadores ofensivos de todos os tempos está ao seu melhor nível, uma máquina geradora de lançamentos impossíveis de defender que traduziu a sua eficiência em campo na liderança da Conferência até à sua lesão, que colocando em séria dúvida a sua presença no jogo das estrelas, não impedirá a sua nomeação.

Giannis, num silêncio mediático similar àquele que rodeia Jokic (o facto de serem ambos europeus será com certeza uma infeliz coincidência), vai construindo noite sim noite sim as suas campanhas para Jogador Mais Valioso e Jogador Defensivo do ano, algo que o grego transformou num facto trivial nas últimas quatro temporadas. Os Bucks estão 15-3 com o seu Big 3 e parecem pouco preocupados em fazer manchete até à hora das maiores decisões, e Giannis personifica este sentimento enquanto a sua produção, de acordo com a grande maioria das estatísticas avançadas, é apenas superada pela de… um certo sérvio.

Fechamos a votação com o jogador mais ‘quente’ da NBA. Joel Embiid em 2022: 32.3/10.1/4.7 com percentagens de lançamento de 55.6% de campo e 83% da linha numas surreais 11.8 idas por jogo. O camaronês parece imune à saga de Ben Simmons, e enquanto o front-office trabalha arduamente nos bastidores, a sua estrela maior faz o mesmo dentro de campo, sendo membro do restrito lote de atletas que pode afirmar estar na conversa de melhor jogador do mundo em ambos os lados do campo. Aquilo que fez aos Magic na passada quarta-feira foi o ponto de exclamação num ano quase perfeito até agora:

Tragam uma boa peça a este homem nesta deadline, e pode ser que ele vos traga um título, Sixers.

Dada a unanimidade da votação, pouco há a dizer sobre a concorrência. Uma palavra para Jimmy Butler, que tem feito uma época enorme quando tem jogado. Não acumulou jogos suficientes para entrar nesta conversa (como o seu colega Bam Adebayo), caso o tivesse feito deveria sem qualquer dúvida ser o companheiro de DeMar DeRozan no backcourt (Butler estava elegível no frontcourt, ao contrário de DeRozan. Peçam à NBA para vos explicar, que eu não consigo). Uma nota para as temporadas de Jarrett Allen, a brilhar nos surpreendentes Cavs, e Jayson Tatum, que apesar de alguma irregularidade tem sido dos melhores extremos da conferência, nuns anónimos Celtics.

Voltamos para a semana com as reservas!

por LUCAS NIVEN [@lucasdedirecta]

Autor

Borracha Laranja

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