Uma visão helicóptero sobre a lottery de 2022
Com o aproximar do Draft, e um pouco como fiz o ano passado, decidi dar por terminado o formato scouting report completo, e fazer aqui uma apreciação mais resumida da lottery, focando-me brevemente em alguns nomes fortes da classe de ’22. Sem perder mais tempo, aqui fica:
Keegan Murray
Estatísticas 21/22: 23.5 Pts/J (55.4 FG%, 39.8 3P%, 74.7 FT%), 8.7 Ress/J, 1.5 Ast/J, 1.9 Des/J, 1.3 Roub/J, (31.9 Min/J)
Um dos finalistas para o Naismith Player of The Year, Keegan Murray teve um percurso meteórico e assumiu-se como uma potencial escolha no top-5. Estando em ligeiro desacordo com esta linha de pensamento, farei o meu melhor para fazer justiça à qualidade do jogador.
Keegan é um 4 não especialmente alto, mas relativamente longo, largo e forte. Mais velho do que o usual sophomore, Murray assumiu um papel de #1 ofensivo numa equipa sem talento de backcourt, tendo correspondido da melhor maneira (28.1 USG% e 63.8 TS%).
Murray é o tipo de big que vai ser uma ameaça em transição, fazendo o leak out da tabela cedo e sprintando para ser um alvo para um passe de campo inteiro, ou conseguindo ressaltar e levar a bola de uma ponta a outra. De forma semelhante, é inteligente como peça ofensiva secundária, seja a oferecer linhas de passe no dunker spot, a jogar no bloqueio directo (conseguindo mergulhar ou abrir e disparar de 3), caçar/forçar trocas no poste baixo, ou receber e atirar na linha de 3, zona de onde tem progredido imenso.
O meu problema prende-se com a maneira como cria ataque individual. Keegan é um bom jogador de costas para o cesto, com força e touch para finalizar, e alguém que consegue atacar closeouts, ou receber e encarar o homem 1v1 no poste alto, mas a sua criação de vantagens é consistentemente residual. Se tal é o caso na NCAA, como é que será na NBA, onde existem atletas para apagar essas vantagens diminutas?
Murray tem uma primeira passada sólida, mas longe de explosiva, e um drible pouco criativo, ou até seguro. É forte q.b. para ganhar vs bases, e ágil para ‘quebrar’ postes pés de tijolo, mas, com 22 anos, já está mais perto de ter um ‘corpo de homem’, e está ainda algo longe de ser um mismatch nightmare, como os jovens de hoje dizem. No fundo, o que quero dizer é que Murray está mais perto de ser uma peça ofensiva secundária e um finalizador que tira proveito do ataque criado por outros, mais do que aquilo que foi este ano. O que me leva à defesa.
Murray tem traços interessante para um big moderno. Sem ser excelente em nenhuma cobertura, é flexível ao nível do P&R, conseguindo defender em drop, ou até trocar ao nível de bloqueio directo. É ágil o suficiente para defender alguns wings fortes e ajudar a impermeabilizar a defesa no ponto de ataque.
Para mim, a ideia com ele seria sempre isso – um belo role player ofensivo que, no outro lado, era versátil, activo e mega inteligente nas ajudas e a capitanear a defesa, oferecendo boa protecção de cesto secundária e jogando como small ball 5, a espaços. Esse jogador merece o hype no top-6, mesmo com quase 22 primaveras, mas foi nesta segunda parte que ele falhou – Keegan é um bom defensor colectivo, envolvido e comunicativo, mas foi demasiado inconsistente nesta vertente do jogo para o considerar esse defensor de antenas sempre no ar, como o Devin Vassell foi em FSU, por exemplo.
A juntar a isso, não acredito que tenha o tamanho, instintos e, especialmente, técnica de verticalidade para ser um protector de cesto verdadeiramente fiável, apesar de um belo Blk rate de 6.4.
Para ser 100% justo, claro que não deixa de ser fantástico que o Hawkeye tenha sido consistentemente sólido na defesa, numa temporada que tanto o desgastou no ataque, e pode ser que, sofrendo um downsizing ofensivo, esse conector defensivo que eu imaginei comece a aparecer.
Para arrumar tudo, Keegan Murray é o tipo escolha que dificilmente vai causar o despedimento de alguém. Bom a razoável em quase tudo, mau em quase nada, o extremo-poste correspondeu numa situação difícil. Para mim, é demasiado produtivo para não justificar uma escolha até ao fim do top-10, mas é também alguém que não preenche um papel de grande escassez posicional, que não tem um perfil atlético apetecível, enfim, um caminho claro até ao estrelato, ou mais perto disso.
Johnny Davis
Estatísticas 21/22: 19.7 Pts/J (42.7 FG%, 30.6 3P%, 79.1 FT%), 8.2 Ress/J, 2.1 Ast/J, 1.2 Roub/J, (34.2 Min/J)
Passamos de um finalista do Naismith Player of The Year para outro – Johnny Davis, o extraordinário base de Wisconsin, que, depois de uma temporada de freshman longe das luzes, aparece como mais um nome forte da lottery.
Davis é um tough shotmaker em potência, com uma capacidade especial para disparar a partir do drible, usando com perícia o bloqueio no P&R, bem como a sua estrutura larga, muito forte, e excelente trabalho de pés, para chegar aos seus sítios favoritos. Para além disso, é um dos melhores bases a jogar de costas para o cesto na meia distância, reproduzindo, de certa maneira, o jogo de Devin Booker.
Um bocadinho como Keegan Murray, e apesar de ter uma passada forte e repentina q.b., não é alguém que crie vantagens com imensa facilidade no 1v1. É, maioritariamente, um penetrador em linha recta, que não tem AQUELA explosão especial, da mesma forma que não tem a ginga necessária no drible para quebrar o homem (seguro, mas técnica simples e pouca criatividade). Foi atirado para a posição ingrata de criador heliocêntrico em Wisconsin, uma equipa com uma escassez de talento ofensivo, e a sua eficiência sofreu com isso (31.6 USG% e 52.2 TS%).
A juntar a isto, não é um passador que faça leituras avançadas no P&R. Não toma más decisões (12.7 TO%), mas também não é alguém que manipule ou preveja as ajudas defensivas. Fica-se por aquilo que faz bem – dump offs, drive and kicks, decisões sólidas, mas simples.
Ainda assim, é alguém que prevejo como encaixando que nem uma luva num papel de combo guard, escolhendo os seus momentos no 1v1. É um excelente encaixe a jogar sem bola – sabe decidir rápido, preencher os espaços vazios, tem um pulmão incansável e é dos jogadores mais inteligentes que já vi a dançar por entre bloqueios indirectos, para criar algum espaço para cortar, ou receber e lançar. Resta saber se as percentagens exteriores estarão mais perto dos 30 e muitos % do início da temporada, ou dos mais preocupantes 30 e muito pouco, do fim da mesma.
Outro ponto que contribui para a sua projecção como um puto que simplesmente vai encontrar maneiras de impactar o jogo, é a sua defesa. Um belo defensor individual no 1v1, é uma autêntica carraça, forte a absorver contacto, ágil lateralmente, chato com as mãos e incansável a navegar bloqueios. Não é o tipo de atleta que conseguirá ficar à frente de toda a gente, não tem essa dádiva divina, mas é difícil não o projectar como um verdadeiro positivo no ponto de ataque.
A juntar a isso, é um dos melhores defensores colectivos da classe. Joga com força e com propósito, é muito bom posicionalmente, tem faro para as linhas de passe e instintos acima da média a surgir como homem extra a proteger o cesto (especialmente para um base – Blk rate 2.3, Stl rate 2).
Num draft onde, depois do top-4, de AJG e do joker Sharpe (se quiserem incluir), há um sinuosa queda de valor, Johnny Davis é um dos homens que tem de se seguir. Demasiado bom a jogar basquetebol, demasiado versátil e industrioso, o Badger encaixa em muitos dos franchises que vão escolher dentro da lottery. Entendo alguma desconfiança com os 30.6% de 3 e os 36.8% de midrange, mas, com uma técnica competente e uma temporada incrivelmente exigente, Davis mereceu a minha confiança.
Bennedict Mathurin
Estatísticas 21/22: 17.7 Pts/J (45 FG%, 36.9 3P%, 76.4 FT%), 5.6 Ress/J, 2.5 Ast/J, 1 Roub/J, (32.5 Min/J)
Terminamos esta tríade de talento com Ben Mathurin, o sophomore de Arizona, que depois de ter namorado o Draft do ano passado, onde era visto com uma potencial escolha de top-20, apostou em voltar para Tucson e elevou o seu stock, com uma belíssima 2ª temporada.
Inicialmente visto como um possível 3&D, o Québécois evoluiu no sentido de se transformar num projecto de marcador de pontos secundário a partir da asa, tirando proveito da motion offense dos seus Wildcats.
Se começarmos com o que ele sempre fez bem, e que lhe dá utilidade ofensiva todo-o-terreno – Mathurin é uma fantástica peça ofensiva longe da bola, seja transição a carregar bola ou nas linhas de passe, saindo de bloqueios indirectos para subir e disparar velozmente, a cortar na linha de fundo, sempre tirando proveito do seu belo perfil atlético (óptima velocidade de ponta e aceleração na passada).
Este ano, Mathurin juntou a isso uma melhorada capacidade de marcar pontos com a bola na mão, com um imperturbável tiro a partir do drible, e um jogo muito mais maduro no P&R, onde usa dribles pacientes para adormecer o defensor e atacar de seguida, pressionando o aro com eficiência.
É um passador subvalorizado, na minha opinião. Um bocado o inverso do Johnny, não é um decisor 100% confiável, nem é preciso na colocação da bola, mas tem uma técnica vistosa a passar a partir do drible, por vezes só com uma mão, e tem conseguido usar bem a sua gravidade como scorer para encontrar o passe para o big a desbloquear, no P&R.
Apesar das francas melhorias, e mesmo com uma passada explosiva, não prevejo que se torne um dínamo no 1v1, muito devido ao seu drible pouco seguro (a bola não acompanha o corpo), e a uma estrutura física que, em tape, me parece mais fraca do que aquilo que as medidas indicam. Também não é o melhor decisor com bola, ocasionalmente procurando o cesto pela linha mais congestionada, ou esbarrando contra uma futura falta ofensiva.
Se o ataque viu claras melhorias em 21/22, a defesa (que nunca achei mais do que ‘boazinha’), foi uma clara desilusão, em vários sentidos. Não achando que se tenha transformado, ou que vá vir a ser um negativo a defender a asa, Mathurin, que nunca foi o interpretador de jogo mais arguto deste lado do court, mostrou uma acrescida apatia e desatenção a defender longe da bola, falhando rotações simples.
Mesmo em cima do portador, onde sempre foi um pouco melhor, os resultados não foram bons. Navegar bloqueios directos passou a ser uma tarefa hercúlea, manter uma postura correcta nem sempre aconteceu. Não consigo usar a desculpa da carga ofensiva, que não foi assim tão alta. O positivo que fica é a sua estrutura física, controlo corporal e agilidade lateral, que lhe oferecem alguma capacidade para jogar no erro. É um ponto de partida!
Tudo junto, e não querendo terminar numa nota excessivamente negativa, Ben Mathurin é um interessante asa marcador de pontos, com habilidades imediatamente traduzíveis na NBA, uma linha de progressão notável no último ano e um perfil atlético que pode ajudar a mitigar alguma da sua regressão defensiva. Olho para a lottery e vejo equipas como os Pels, que deviam estar a salivar só de pensar no que este jovem Canadiano poderia fazer em ‘Nawlins’.
Outros nomes que, sim senhora, vale a pena conhecerem:
AJ Griffin (G/F): O 5.º melhor prospect deste Draft, na minha humilde opinião. O freshman de Duke tem uma combinação especial de tamanho (1,98m; 2,13m de envergadura e muito largo), força bruta, potência vertical e tiro exterior (44.7 3P%, com alguns pull ups e stepsides no bolso). Encaixou bem num papel ofensivo secundário, mas é menos explosivo do que o expectável a atacar com bola e tem muitas arestas por limar em posse. Tem versatilidade para ser uma peça interessante a defender o ponto de ataque. Um dos miúdos mais novos do Draft, lidou com algumas lesões no final da sua carreira de HS.
Jalen Duren (C): Um James Wiseman, só que bom. Outro freshman bem novinho (novembro de 2003), Duren reclassificou da classe de 23 para 22, jogando, também ele, em Memphis. Grande (2,11m) e bem atlético, demonstra grande potência vertical para cumprir o papel de rim runner no ataque, e, não sendo muito mais que isso, tem uma visão de jogo decente quando enquadrado com o cesto. Para já, é um drop big com sentido posicional e instintos de protecção de cesto, mas pode desenvolver-se no sentido de ganhar alguma flexibilidade a defender o P&R.
Shaedon Sharpe (G): O grande joker do Draft, Sharpe aparece como um eventual elegível já a temporada de NCAA ia quase a meio. O seu calling card é a combinação de atletismo quasi-nuclear, corpo tankado (1,96m; 89,8kg e ombros largos) e shotmaking (pull ups, stepbacks, tudo isso). O drible não é o melhor, castrando-o no P&R e um pouco no 1v1, e a defesa é bastante desatenta, especialmente sem bola. Sem jogar há bastante tempo e sem nunca ter calçado por Kentucky, é a personificação da jogada de alto risco, alta recompensa.
Jeremy Sochan (F/C): É um glue guy e um projecto do tipo de big moderno cada vez mais valioso nos playoffs. Um dos Santos padroeiros do Draft Twitter, tem o tamanho e agilidade (2,06m) para ser versátil no P&R, bem como o motor e inteligência posicional para unir os pontos e ajudar na protecção de cesto. Ofensivamente, é um finalizador de jogadas com bom passe e alguma promessa no drible, mas tem de acrescentar um tiro exterior (29.9% de 3) para desbloquear o seu jogo a 100%. Os iluminados vão escolher Sochan com a pick #15, não Murray no #5.
TyTy Washington Jr (G): O freshman que teve o desprazer de passar o ano com John Calipari. Um combo guard com medidas decentes (1,91m) mas sem atletismo para criar separação, Washington compensa com uma certa ginga no P&R, tomando decisões mais avançadas do que aquilo que recebe crédito. Tem um tiro exterior mais que aceitável, e um excelente pull up de meia distância, que o torna muito bem equipado para atacar defesas em drop. Na defesa, a conversa é semelhante – é certinho e activo, mas o seu perfil atlético não lhe permite ficar à frente de muitos portadores no 1v1. É um jogador de basquetebolTM, ponto final.
por NUNO SOARES [@NunoRSoares]