Há dias, o Lucas Niven explicou aqui, com lapiseira de ponta fina, todo um processo (não, o uso da expressão não foi coincidência) que levou à atual dissonância entre Ben Simmons e a sua entidade empregadora, os Philadelphia 76ers.
Com esse contexto debaixo do braço, facilmente chegamos à conclusão que ambas as partes caminham para um inevitável adeus. No entanto esta situação é mais complexa que exemplos anteriores de jogadores descontentes/pedidos de troca.
Porque os quatro anos que Simmons ainda tem no contrato que assinou a 16 de julho de 2019 dão latitude aos Sixers para não tomar uma decisão apressada, por mais que se grite que a situação é insustentável. Isto era verdade a 24 de junho, quando o agente de Simmons, Rich Paul, falou pela primeira vez com o franchise sobre trocarem o seu cliente e continua a ser verdade neste preciso momento.
A atual situação é incómoda para ambas as partes, mas com Daryl Morey a liderar a tomada de decisão nos Sixers, era fácil de adivinhar que este impasse não seria resolvido de um dia para o outro. Isto porque o valor de mercado de Ben Simmons é, com toda esta confusão, inferior ao seu potencial enquanto jogador e porque o Presidente das Operações de Basquetebol dos 76ers é conhecido por ser um duro negociador que não tem medo de situações desconfortáveis.
Apesar de Morey já ter tido várias discussões sobre uma eventual troca do Ben Simmons, a sua posição manteve-se inalterada desde o início: ou tem Ben Simmons a jogar com a camisola dos 76ers ou quer um jogador que “faça a diferença” em troca.
E de acordo com várias notícias e relatórios de fontes sobre a situação, as palavras têm correspondência nas ações. Foi reportado por Adrian Wojnarowski cedo em todo este processo que os Sixers estavam a pedir pelo Ben Simmons algo parecido com o que os Rockets receberam pelo James Harden.
Podemos olhar para o que está a ser pedido pelos Sixers como uma autêntica loucura, tendo em conta o valor de mercado atual, mas a verdade é que, munido com a vantagem de ter o Ben “trancado” com um contrato de longa duração, Morey está simplesmente a “jogar o jogo”. Um jogo que conhece como ninguém. Entre 2007 e 2020, durante o seu reinado no front office dos Rockets, o dirigente trocou um total 77 jogadores, uma marca apenas batida pela sua atual equipa a atravessar “O Processo”. E esse histórico não lhe fez muitos amigos entre a sua classe, exatamente por ser conhecido por fazer ofertas irrealistas para promover a subida/descida do valor de negócio consoante os seus interesses.
E é exatamente isso que Daryl Morey está a fazer aqui. Eu creio que ele sabe que não vai conseguir trocar o Ben Simmons pelo que tem pedido pela liga fora. Mas deve pedir pouco pelo seu jogador all-star e all-defensive? Quanto menos pedir, menos as equipas interessadas vão oferecer. Ao atirar para as nuvens, Morey mantém-se coerente com a sua intenção de manter o atleta valorizado. Ele simplesmente está a aguentar firme até que apareça um negócio satisfatório e, em abono da verdade, não tem alternativa. Com Joel Embiid no topo do seu jogo, o momento dos Sixers é agora. E perante a concorrência, Daryl Morey não pode dar-se ao luxo de trocar Ben Simmons, o seu principal ativo para poder melhorar a equipa, por algo que resulte numa perda de qualidade da mesma.
Podemos especular que esse barco já partiu. E pode muito bem ser esse o caso. Mas que alternativa existe? Resignar-se? Não é o estilo de Morey. Não com quatro anos até final do contrato do Ben e com a certeza de que a NBA muda muito rapidamente e obedece ao princípio popularizado por António Pimenta Machado nos anos 80: “O que hoje é verdade, amanhã pode ser mentira”.
Não acredito que Daryl Morey não queira trocar Simmons. Penso que, apesar de dizer que gostava de poder contar com o jogador, ele sabe que isso é virtualmente impossível com toda a água que já passou por debaixo da ponte. Mas irá poder aguentar Ben ad eternum? Não me parece. Mas em termos de timing, não prevejo que uma troca possa ocorrer antes de 15 de dezembro.
E porquê 15 de dezembro? Porque quando um free agent assina um novo contrato, não pode ser trocado antes da data mais tardia entre três meses depois da assinatura do contrato e 15 de dezembro. Existem alguns contratos específicos cuja restrição dura até 15 de janeiro, mas a esmagadora maioria tem em dezembro a data da sua elegibilidade para entrar no jogo das trocas. Ora, com mais de 150 novos contratos assinados neste verão (estamos a falar de um terço de toda a NBA), é fácil de perceber a importância desta data que marca o início não oficial da trade season.
E é exatamente entre 15 de dezembro e o trade deadline (10 de fevereiro) que os telefones em Philadelphia estarão mais ocupados em buscar de um negócio que satisfaça Morey e que possa terminar esta saga que já ocupa o espaço mediático basquetebolístico há cerca de cinco meses.
Mas para onde?
Construir uma troca em volta de um jogador com todo este contexto, que tem um salário alto ($33.003.936 em 20-21) e com um skillset “particular”, apesar de apetecível é no mínimo… desafiante. Porque uma troca só é feita se fizer sentido para ambas as partes. Muitas vezes, os fãs de uma determinada equipa querem trocar o seu lixo pelo ouro alheio. Mas a vida real funciona de maneira diferente. E é por isso que, na generalidade, construir uma troca na NBA é algo muito mais complicado do que parece. As trocas que vemos concretizadas são conversadas e negociadas muitas vezes durante meses a fio e são muito menos que os potenciais negócios que caem por terra ao longo do caminho.
Apesar disso trago-vos três cenários à discussão para uma eventual troca do Ben Simmons. Não me atrevi a construir cenários com três, quatro ou cinco equipas, porque não queria passar o limiar da exequibilidade (apesar de ter passado na mesma como vão ver mais à frente). Mas deixo-vos com estes cenários são pelo menos passíveis de colocar-nos a pensar sobre o assunto.
- Portland Trail Blazers recebem Ben Simmons
- Philadelphia 76ers recebem CJ McCollum + 1st round picks dos Blazers em 2024 e 2026 protegidas no top10 em 2024 e no top8 em 2026
Sixers: Daryl Morey quer o Lillard, não o McCollum. Mas depois da mais recente carta de amor de Lillard à cidade de Portland, é difícil de imaginar que o base All-Star esteja disponível no curto prazo. CJ McCollum não vai resolver todos os problemas dos Sixers, mas é um grande upgrade a um Simmons na bancada. Apesar de ser um borderline All-Star, McCollum já completou 30 anos e algum draft capital teria que ser introduzido para convencer os Sixers que este pode ser o melhor negócio que poderão fazer. Daí a inclusão de duas 1st picks que só poderiam, por causa da Stepien Rule, ser trocadas se os Blazers aceitassem retirar as proteções que têm na 1st pick de 2022 que enviaram para Chicago. Com estas duas futuras 1sts, Morey poderia ir tentar pescar mais alguém para ajudar no esforço atual de tornar esta equipa num contender a sério.
Blazers: Chauncey Billups tem experimentado com a defesa dos Blazers, numa tentativa de tornar a equipa mais competitiva desse lado do campo. Um dos grandes problemas defensivos da equipa é um backcourt com, diria de forma eufemística, pouca apetência para defender. Substituir CJ por Ben, iria fazer maravilhas pela defesa da equipa ao mesmo tempo que mantém pelo menos um playmaker no cinco não chamado Dame Lillard. Há muitos anos que se fala de uma separação de Dame/CJ. Ben Simmons seria um retorno que valeria a pena considerar esse cenário até agora rejeitado.
- Brooklyn Nets recebem Ben Simmons
- Philadelphia 76ers recebem Kyrie Irving
Ora bem, todos sabemos que isto não vai acontecer, mas não vamos esconder que isto não faz algum sentido para ambas as equipas. E estaríamos perante um dos poucos cenários onde, se calhar -repito, se calhar -, o Kyrie aceitaria jogar, dado ser perto de onde reside com a sua família (toda a narrativa do Kyrie ameaçar retirar-se caso fosse trocado advém do facto de ele preferir esse cenário a jogar longe da sua família).
Sixers: trocar o Ben Simmons por um dos melhores playmakers individuais que a liga tem? Colocá-lo ao lado de um big que suscita muita atenção defensiva, de um shooter como o Seth Curry e um agente do caos defensivo como Matisse Thybulle? Onde é que o Morey assina?
Nets: Sim, o Simmons não lança e isso será sempre problemático nos playoffs. Menos problemático se jogar ao lado de um James Harden, um Kevin Durant e um Joe Harris.
Em última instância os Nets estariam a dar o “ouro ao bandido” e essa seria a principal das MUITAS razões pelo qual este cenário apenas existirá no campo hipotético.
- Sacramento Kings recebem Ben Simmons
- Philadelphia 76ers recebem De’Aaron Fox
Sixers: O Fox poderá não ser um jogador do nível que o Morey imaginava trocar pelo Simmons, mas perante todo este cenário se calhar é dos melhores retornos que poderá aspirar. O base ainda não completou 24 anos e seria um bom playmaker para inserir no cinco inicial dos Sixers e ajudar Embiid a criar jogo ofensivo. Para além disso, é um jogador que iria certamente ajudar defensivamente apesar de não ao nível de Simmons. Resolução adequada de um problema bicudo.
Kings: Já vejo os fãs dos Kings a gritar “NEM PENSAR! ESTE GAJO ESTÁ MALUCO”. No entanto, pergunto, qual é o teto do De’Aaron Fox enquanto jogador? Alguma vez será tão bom como o de… Ben Simmons? A diferença de currículos de ambos fala por si para além de que a troca de um pelo outro significaria um upgrade defensivo, algo que os Kings precisam como de pão para a boca. Outra coisa que os Kings precisam como de pão para a boca? Alcançar os playoffs, algo que não fazem desde a época de 05-06. Com Davion Mitchell a mostrar que pode contribuir de imediato e Haliburton já um dos preferidos dos fãs, a troca de Fox por Simmons poderá fazer mais sentido do que parece. Eu sei que a malta estava a pensar que se calhar era possível trocar o Hield, o Bagley, uma tosta mista e um Compal pelo Simmons, mas isso nunca foi uma possibilidade. Eu acho sinceramente que trocar o Fox por Ben iria dar um boost nas possibilidades dos Kings de chegar aos playoffs e nesse sentido esta seria uma troca benéfica que iria resolver problemas de profundidade futuros que Fox/Haliburton/Mitchell vão certamente suscitar no backcourt.
Com um desfecho impossível de prever, pode estar aqui um movimento com implicações no futuro da liga a curto/médio prazo. Entretanto continuamos a assistir a esta novela que vai está a testar a paciência de Ben Simmons, Philadelphia 76ers e também dos milhões de fãs de NBA que existem à volta do mundo (certo, Kyrie?).
por JOÃO COSTA [@JoaoPGCosta]